Eu mal podia sentir o meu corpo, mas minha cabeça parecia
pesar uma tonelada. Era como se abrir os olhos fosse consumir uma energia que
eu absolutamente não tinha. Um zumbido interminável parecia passear pelos meus
ouvidos, tentando levar minha sanidade para longe de mim.
Abrir os olhos era uma experiência extremamente dolorosa,
mas, na minha atuação situação, eu não podia me dar ao luxo de ficar
descansando, esperando o que quer que fosse acontecer.
Toras de madeiras paralelas, formando um teto baixo, foi a
primeira coisa que minha vista alcançou. Eu sabia que, se me levantasse,
poderia toca-las com as minhas mãos. Olhei disfarçadamente, tentando não
alertar alguém que estivesse presente, mas aquele lugar era pequeno demais para
que alguém pudesse se esconder, e eu estava completamente sozinha.
Me sentei devagar, testando a dor que eu estava sentindo,
mas ela era suportável. Aquilo era uma cabana de madeira, como nas histórias
que eu ouvia quando criança, pequena e muito desconfortável. A cama em que eu
estava parecia ser o único lugar ali que alguém poderia descansar e, não havia
acessórios o suficiente naquele lugar para uma vida minimamente confortável.
A porta estava a poucos passos de onde eu estava, e eu não
sabia se queria realmente encontrar o dono daquele lugar quando ele voltasse.
Levantei da cama e alcancei a porta em um segundo, mas antes de sequer ter a
chance de abri-la, alguém do outro lado fez esse trabalho, com muito mais força
do que seria necessário, fazendo a porta bater diretamente em mim e me
arremessando de encontro ao chão.
Se minha cabeça antes estava latejando, agora eu não sabia
mais definir a intensidade da minha dor. A raiva que eu estava sentindo antes
de desmaiar voltou com força total, e eu preparei o meu olhar de ódio para quem
quer que tivesse chegado, por mais que eu suspeitasse quem seria o meu algoz.
Aquela velha ainda estava parada a porta, da mesma forma em
que eu a vi a porta do meu quarto, antes de todo aquele pesadelo começar. Ela
parecia achar graça da minha situação, o que me enfureceu ainda mais. Não pude
deixar de notar que suas mãos estavam ocupadas. Ela segurava duas cestas,
repletas de comida, o que a teria impedido completamente de abrir a porta,
principalmente com aquela força.
Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ela entrou na
cabana, e a porta se fechou as suas costas, como se aquilo tivesse sido feito
por magia, mas não pude deixar de notar o vento que passou por mim quando isso
aconteceu.
Ela parecia completamente à vontade, como se nada de
estranho estivesse acontecendo, como se a princesa do reino que ela pertencia
não estivesse bem a sua frente, a mesma princesa que ela havia amaldiçoado.
Isso era algo sem precedentes e, por mais que eu estivesse com raiva, não sabia
como agir, principalmente com a frase que ela disse em seguida.
- Você está com fome? – Ela estava de costas, mexendo nos
alimentos que ela tinha trazido, mesmo assim eu podia sentir o sorriso
brincando em seus lábios. Ela claramente se divertia com o meu sofrimento.
Eu não comeria nem um grão sequer que viesse daquela mulher.
Àquela altura, eu já estava a mais de um dia inteiro sem comer, e a fome que eu
sentia não era fruto da minha imaginação, mas não iria ser tão tola de aceitar
algo que viesse da mesma pessoa que havia acabado com a minha vida.
Me levantei devagar, tentando não chamar muita atenção, mas
precisando urgentemente de algumas respostas, para quem sabe assim decidir o
que fazer.
- Quem é você? – Começar pela pergunta mais básica podia me
ajudar de alguma forma.
- Meu nome é Quitéria. – Ela respondeu, para a minha surpresa,
tentando até um sorriso amistoso, como se isso fosse possível depois de tudo o
que aconteceu. – Sou uma das filhas da Deusa dos Ventos.
Não pude impedir uma gargalhada que tentou escapar de meus
lábios. Ela percebeu e me lançou um olhar hostil.
- Filha da Deusa dos Ventos? É assim que vocês se chamam? –
Nem tentei impedir minha próxima gargalhada. Por mais que eu estivesse com
medo, aquele olhar de indignação me causava uma satisfação como eu nunca tinha
sentido. – Você quer dizer que você é uma amaldiçoada, não é? Deusa alguma
faria um ser como você.
Seu olhar de indignação se transformou em alguma outra coisa
que eu não consegui definir realmente. Parecia um pouco com solidariedade, ou
pena. Duas coisas que eu não estava nem um pouco acostumada a lidar.
- Um ser como eu? – Sua voz soava quase quando alguém fala
com uma criança pequena que não entende as coisas muito bem. – Eu acredito que
você quisesse dizer um ser como nós, porque, se você não percebeu, agora você é
exatamente como eu.
- Eu não sou como você. – O grito que deixou minha garganta
foi quase incontrolável. – Eu nunca serei um mostro como você. Eu sou uma
princesa e logo vou voltar para o palácio. Você mal pode esperar pelo o que vai
te acontecer. Você vai ser obrigada a tirar isso de mim, e depois irá pagar
pelos seus crimes.
- Não posso tirar isso de você. – Ela virou as costas
novamente e voltou a mexer em sua comida. – Isso poderia matá-la, faz parte de
você agora.
Aquilo não era possível. Eu precisava me livrar daquela maldição,
foi para isso que eu fugi, para me livrar daquilo e voltar para a minha casa,
para a minha vida, finalmente ter o meu tão sonhado baile e fingir que aqueles
dias não aconteceram.
Ela era a culpada por eu estar passando por tudo aquilo e
iria me ajudar a ter minha vida de volta, mesmo que eu tivesse que obrigá-la a
fazer isso.
Era impossível que ela esperasse que eu fosse fazer algo tão
repentino, então, quando eu segurei seus cabelos com força e joguei sua cabeça
em direção a parede, ela não tentou nem se defender. Sem soltá-la, usando uma
força que eu não tinha, talvez movida pela raiva, a derrubei no chão e me
joguei por cima de seu corpo, para impedir que ela se movesse, mas não parecia
ser necessário. Havia um corte enorme em sua testa, de onde saia uma quantidade
incalculável de sangue. Senti quase um prazer perverso em lhe causar um pouco
da dor que ela estava me causando.
Por mais que o ferimento fosse feio, ela ainda estava
consciente, mas a forma como ela me olhava me fez perceber que estava tonta e
provavelmente desmaiaria a qualquer momento. Eu tinha que aproveitar aquela
oportunidade.
- O que eu tenho que fazer para quebrar essa maldição? – Eu
falei bem perto de seu ouvido, para que minhas palavras não lhe escapassem. – O
que eu tenho que fazer para ter minha vida de volta?
- Você quer sua vida de volta, princesa? – Apesar da dor, a
sua voz não perdia aquele tom insolente. – Então, que assim seja. Para quebrar
essa maldição, só existe uma maneira. – Meu coração quase palpitou de
nervosismo. Finalmente eu poderia acabar com aquilo e ter minha vida de volta.
– Você precisa abrir mão da coisa mais importante de sua vida.
Meu corpo começou a tremer sem acreditar no que eu tinha
ouvido. Aquilo não era possível, eu não queria abrir mão de nada, eu queria ter
minha vida de volta. Voltar a questionar aquela mulher estava fora de
cogitação. Finalmente o ferimento cobrou o seu preço e seus olhos se fecharam.
Se ela estava apenas desmaiada, ou algo mais sério, não era algo que me
importasse. A única coisa que me importava era sair daquele lugar, era fazer
algo para impedir que as lágrimas novamente tomassem conta da minha mente.
Me levantei e corri em direção a porta. Ao chegar do lado de
fora, vi suas pegadas no chão. Não sabia para onde ir, mas, se existia algum
lugar por perto onde eu pudesse me esconder, já seria um bom começo. Não olhei
sequer uma vez para trás.
A cada dia que passa fico com mais vontade de saber desse final e a princesa dos ventos que aguarde hein já tá começando a parecere as surpresas que nem ela imaginava.
ResponderExcluirCom certeza :D
ExcluirObrigada por acompanhar.
Beijos!!!
Oiii
ResponderExcluirA cada parte me vicio mais.
Ansiosa pela próxima parte.
Bjs
Acabei de postar a parte 5 :D
ExcluirBoa leitura!